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A memória não é um arquivo: Como o cérebro pode reescrever o passado.

Você já se perguntou por que algumas memórias parecem mudar com o tempo  ou por que certos traumas continuam tão vivos, mesmo depois de anos? A ciência tem investigado esse tema com profundidade, e as descobertas são surpreendentes. Em vez de serem arquivos imutáveis guardados em nosso cérebro, as memórias são vivas, moldáveis — e até reeditáveis. Sempre que acessamos uma lembrança, especialmente uma memória forte ou emocional, nosso cérebro não apenas a “abre”, mas a torna temporariamente instável. Isso significa que, por um curto período, a memória pode ser reforçada, enfraquecida ou até modificada. Esse processo é chamado de reconsolidação. Ao contrário do que se pensava, até memórias antigas podem mudar. Elas não ficam “presas” no hipocampo para sempre — com o tempo, vão sendo transferidas para outras partes do cérebro, como o neocórtex, e se tornam mais resistentes. Mas isso não significa que estejam fechadas para sempre: em situações de reativação (por exemplo, ao falarmos sobre um trauma), elas podem se abrir novamente e ser atualizadas.

Um dos “protagonistas” nesse processo é o BDNF (fator neurotrófico derivado do cérebro), uma proteína que ajuda os neurônios a crescer, se fortalecerem e criarem novas conexões. Pesquisas recentes mostraram que o BDNF atua durante a reconsolidação, ajudando a modificar memórias reativadas, inclusive memórias negativas, como o medo. Isso abre caminhos para tratamentos inovadores para transtornos como TEPT (transtorno de estresse pós-traumático), fobias ou dependência química.

Esse é um sonho (ou pesadelo) da ficção científica. Mas a ciência caminha com mais cautela. Em vez de “apagar”, os pesquisadores buscam modificar a forma como a memória é armazenada. Estudos mostraram que se o cérebro for exposto a uma memória dolorosa e, logo depois, a uma experiência de segurança ou uma intervenção (com terapia ou medicação), ele pode reescrever parte daquela memória. Em animais, isso já funcion, em humanos, está em fase de testes, mas os resultados são promissores.

Mudar uma memória parece interessante, mas levanta muitas questões: devemos realmente mudar aquilo que vivemos? Até que ponto a lembrança é parte da nossa identidade? Por isso, os cientistas e terapeutas defendem que o objetivo não é apagar o passado, mas transformar a relação que temos com ele.

A memória humana é como um jardim: pode florescer, secar, mudar de forma ou ser replantada. Saber disso é um convite para cuidarmos do que guardamos — e também uma esperança para quem vive preso a lembranças difíceis. A ciência mostra que é possível ressignificar o passado para viver melhor o presente.

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